Crônica - Cenas Platônicas


Confesso. Passei a semana toda vislumbrando você. Até mesmo nos momentos em que você não estava na minha frente. Construí na minha mente cada pedaço seu, dos dedos ao umbigo, da boca aos tornozelos, dos cabelos às unhas pintadas. Meu mal é inventar tais cenas platônicas e essa agora — muito linda, muito perfeita, muito direita, muito real. Penso, sonho, sinto, vivo com você aqui, no meio de todos meus pensamentos, dos mais nobres aos mais profanos.

Profanos, ainda não. Não pude chegar lá. Sinto-me um pouco romântico, apenas, com todos os sintomas: tremor,  timidez, frio na barriga e de repente fico mudo e pensativo. Seria melhor virar um cafajeste, alguém com o controle de seus sentimentos. É eu me encontrar com você para eu esquecer todo o repertório que passei por horas ensaiando. Tudo some. Tudo se torna imprevisível. Os músculos se paralisam e parece que tenho apenas 12 anos. Mas com uma diferença: com 12 anos já teria ido até você e falado todas essas coisas. Entendeu por que seria melhor eu virar cafajeste? Toda essa agonia iria acabar no primeiro hotel vagabundo, na primeira luz de néon piscando na beira do asfalto.

Não precisava falar dizer o quanto você me faz bem. Você sabe. Melhora o meu humor, me faz ter vontade de entrar em forma, de ser mais vaidoso, de comprar roupas, de viajar mais. Me coloca sorriso nos lábios e acelera minha pulsação. Vou gostar de você assim, sem ciúmes, sem cobranças, sem jogos. Nas nossas conversas me sinto bem e sinto falta quando não te encontro. Aí construo essas cenas.

Não quero que você saiba de mim mais do que imagina. Não quero dividir com você minha solidão nem tampouco quero a sua. Quando se juntam duas solidões não é amor. Amar sozinho também não. Como não tenho escolhas não quero que você as tenha também. Viu como sou egoísta? Por favor, não veja mais nada. Tudo isso vai terminar exatamente como começou. Assim que eu conseguir domar meu coração que me desobedece toda vez que vejo você. 

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